Para brasileiros que vivem ou trabalharam fora do país, o planejamento da aposentadoria no exterior envolve uma análise cuidadosa. A interação entre o sistema previdenciário brasileiro e o de outras nações pode parecer complexa, mas compreender as regras, especialmente os acordos internacionais, é fundamental para garantir seus direitos e otimizar seu benefício.
Este guia visa esclarecer como você pode utilizar seu histórico de contribuições, tanto no Brasil quanto em outros países, e quais estratégias adotar para um futuro financeiramente seguro. A legislação previdenciária internacional oferece caminhos, e conhecê-los é o primeiro passo.
O que são os acordos internacionais de Previdência Social?
Os acordos internacionais de previdência social são convênios firmados entre o Brasil e outros países. Seu principal objetivo é garantir a proteção social dos trabalhadores migrantes, permitindo que os períodos de contribuição em um país sejam reconhecidos e utilizados para a concessão de benefícios no outro.
Esses acordos facilitam a vida de quem divide sua carreira profissional entre diferentes nações, evitando a perda de direitos e possibilitando, em muitos casos, a soma dos tempos de contribuição.
Países com acordo previdenciário vigente com o Brasil
É crucial verificar a lista oficial e atualizada, pois novos acordos podem ser celebrados. Atualmente, o Brasil possui acordos com nações como:
- Alemanha, Argentina, Bélgica, Bolívia, Cabo Verde, Canadá (e Quebec), Chile, Coreia do Sul, El Salvador, Equador, Espanha, Estados Unidos, França, Grécia, Índia (observar particularidades), Itália, Japão, Luxemburgo, Moçambique, Paraguai, Peru, Portugal, Suíça e Uruguai.
Com ou sem acordo: Qual a diferença fundamental para sua aposentadoria?
A existência de um acordo internacional entre o Brasil e o país onde você trabalhou (ou pretende trabalhar) é o divisor de águas.
- Com acordo: A principal vantagem é a possibilidade de somar os tempos de contribuição de ambos os países para alcançar os requisitos de aposentadoria (idade, tempo total) em um deles ou em ambos.
- Sem acordo: Não é possível somar os tempos. Para se aposentar em cada país, você precisará cumprir integralmente os requisitos de cada sistema previdenciário de forma independente.
Em ambos os cenários, como veremos, a opção de manter contribuições paralelas pode ser considerada.
Estratégias para quem mora ou trabalhou em país com acordo
Deslocamento temporário: O certificado de Deslocamento Temporário (CDT)
Se você for enviado por uma empresa brasileira para trabalhar temporariamente em um país com acordo, o Certificado de Deslocamento Temporário e Isenção de Contribuição (CDT) é um documento vital.
Imagine Cecília, uma arquiteta, que será designada para um projeto de 18 meses em Portugal. Com o CDT, solicitado por sua empresa ao INSS, Cecília fica isenta de contribuir para a previdência portuguesa durante esse período, mantendo suas contribuições apenas ao INSS no Brasil. Esse tempo contará normalmente para sua aposentadoria brasileira.
- Finalidade: Evitar a dupla contribuição previdenciária.
- Validade: O prazo varia conforme o acordo específico (geralmente até 2 anos, podendo ser estendido em alguns casos).
- Aplicabilidade: Tanto para empregados quanto, em muitos acordos, para trabalhadores autônomos.
Mudança definitiva: Planejando sua contribuição
Para quem se muda permanentemente, o CDT não se aplica. Você terá duas abordagens principais:
Manter contribuições nos dois países
Esta é, frequentemente, a estratégia mais robusta financeiramente a longo prazo. Consiste em contribuir para a previdência do seu país de residência e, simultaneamente, para o INSS no Brasil como Contribuinte Facultativo.
- Vantagem: Possibilidade de obter duas aposentadorias integrais (ou não proporcionais), uma de cada país. Isso oferece maior proteção contra variações cambiais, inflação e possíveis taxas sobre remessas.
- Como Contribuir: A contribuição facultativa ao INSS deve ser de, no mínimo, 20% sobre o salário mínimo brasileiro vigente, podendo ser maior, até o limite do teto previdenciário, para buscar um benefício mais elevado. Importante: Residentes no exterior como facultativos não podem ser MEI ou sócios de empresas no Simples Nacional no Brasil.
Utilizar o acordo para somar tempos (Totalização):
Se manter duas contribuições for inviável, o acordo permite somar os períodos trabalhados no Brasil e no país estrangeiro para cumprir os requisitos de aposentadoria.
- Funcionamento: O tempo totalizado é usado para verificar o direito ao benefício. Se concedido, cada país pagará uma parte proporcional ao tempo contribuído em seu sistema.
- Resultado: Você pode receber duas aposentadorias “fracionadas”.
- Procedimento: O pedido de inclusão do tempo do exterior no INSS (ou vice-versa) é feito através dos Organismos de Ligação (agências internacionais do INSS). Esse processo pode ser demorado, e o auxílio de um advogado especializado pode ser muito útil.
Contribuição facultativa do exterior: Como manter seu vínculo com o INSS
Para continuar contribuindo ao INSS morando fora, como facultativo, você pode emitir a Guia da Previdência Social (GPS) pelo portal Meu INSS. O valor da contribuição impactará diretamente o cálculo da sua futura aposentadoria brasileira.
Guia Completo: Como Contribuir para o INSS Morando no Exterior
Recebendo sua aposentadoria ou pensão brasileira no exterior
Se você já é aposentado ou pensionista do INSS ou de um Regime Próprio (RPPS) e reside em um país com acordo, pode continuar recebendo seu benefício.
- Procedimento: Solicite a transferência de benefício em manutenção para o exterior junto ao INSS (via Meu INSS ou Organismos de ligação) ou ao seu RPPS. Será necessário indicar uma conta bancária no exterior.
- Países sem acordo: O recebimento pode ser mais complexo, geralmente exigindo a nomeação de um procurador no Brasil para receber e remeter os valores.
Questão da tributação: Imposto de renda sobre benefícios remetidos
Um ponto crucial é a incidência de 25% de Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) sobre aposentadorias e pensões pagas pelo Brasil a residentes no exterior.
- Controvérsia: Essa tributação é questionada judicialmente, pois a aposentadoria é fruto de contribuições e não “rendimento do trabalho no exterior”. O Supremo Tribunal Federal (STF) tem a matéria sob análise, mas o julgamento está pendente.
- Exceções: Acordos para evitar a dupla tributação com certos países (como Espanha, Japão, Itália e Luxemburgo) podem prever isenção ou alíquotas diferenciadas. Mesmo nesses casos, a retenção pode ocorrer indevidamente, exigindo intervenção.
- Ação judicial: É possível ingressar com ação para cessar a retenção e, em alguns casos, reaver valores pagos indevidamente, após requerimento administrativo negado pela Receita Federal.
Conclusão
A aposentadoria no exterior para brasileiros é viável e pode ser otimizada através dos acordos internacionais e de um planejamento cuidadoso. Seja somando tempos de contribuição, mantendo contribuições paralelas ou transferindo um benefício já existente, o conhecimento das regras e procedimentos é seu maior aliado.
A decisão entre buscar uma aposentadoria proporcional utilizando os acordos ou manter dupla contribuição para dois benefícios integrais depende da sua realidade financeira e objetivos de longo prazo. Em todos os casos, a orientação especializada é fundamental para evitar perdas e garantir o melhor resultado possível.


FAQ
Resumo do artigo
A contribuição é de 20% sobre um valor escolhido pelo segurado, que deve estar entre o salário mínimo nacional vigente e o teto previdenciário do INSS.
Para fins de soma de tempo com o INSS, sim. No entanto, você pode buscar a aposentadoria naquele país seguindo as regras locais e, paralelamente, manter contribuições como facultativo ao INSS para garantir uma aposentadoria brasileira.
Sim, pode ser mais demorado que um pedido convencional, pois envolve a comunicação entre os Organismos de Ligação de diferentes países. A assessoria especializada pode ajudar a agilizar e evitar erros que causem mais atrasos.
Após a concessão da aposentadoria, não é possível realizar novas contribuições para aquele benefício específico visando aumentar seu valor. O planejamento prévio das contribuições é crucial.
A DSDP é uma obrigação fiscal e não cancela seu direito à aposentadoria. Contudo, é um dos indicativos para a Receita Federal aplicar a tributação de 25% sobre os benefícios remetidos, e é importante comunicar sua situação ao INSS/RPPS para a correta manutenção do benefício no exterior.